Paixão segundo São Mateus | Música para a Liturgia | Joaquim dos Santos
Das várias interpretações que se quiseram fazer dos documentos saídos do Concílio Vaticano II muitas houve que não estiveram de acordo com a profundidade do que foi trabalhado, pensado e escrito.
A música não terá sido o núcleo que fez um Concílio Vaticano II caminhar mas com certeza que sempre foi olhada com a elevada importância que tem. O que está feito, está feito mas é um facto que se assistiu/assiste a uma espécie de hiato no que respeita ao culto da Paixão, principalmente ao nível musical. Sim, há inúmeras formas musicais e inúmeros textos de beleza intocável que abordam o intenso e profundo tema mas uma música que nasça inteiramente do suor de sangue da Paixão… não. Tanto ao nível da música com funcionalidades litúrgicas como ao nível da música de concerto, ao que se consegue apurar, Portugal viu-se sem a intensidade da Paixão durante largos anos. Viu-se e vê, de certa forma. Nos dois planos as obras que existem não são apresentadas ou utilizadas com frequência ou com dimensão.
Numa nota à sua grande Paixão segundo São Lucas, para 5 solistas, coro misto e orquestra, Joaquim dos Santos faz a alusão de esta obra ser o culminar dum antigo e lindo sonho (…) desde as cerimónias que então se faziam na Sé de Braga… e já lá vão mais de quarenta anos! (1999). Com este pequeno parágrafo sabe-se que, em tempos não muito distantes, houve a tradição de apresentar os textos da Paixão na sua forma cantada. Muito provavelmente cantavam-se autores dos séculos XVII/XVIII, e muito provavelmente cantariam na forma mais comum de três diáconos e coro (turbas).
O que é certo é que desde a reforma litúrgica do Concílio Vaticano II e a consequente introdução do vernáculo na Liturgia da Palavra abriu-se um fosso na veneranda tradição do canto da narração da Paixão (…) (Pe. Pedro Miranda, 2002)
Tanto quanto se possa saber, a primeira experiência de dotar o canto da Paixão em português para se poder utilizar na Liturgia surgiu em 1977, surgiu pela mão do Pe. Joaquim dos Santos. Trata-se duma pequena composição que foi utilizada inúmeras vezes pelo Maestro nas várias celebrações que fazia. Pensada para os coros com pouca formação, há uma versão para duas vozes iguais e órgão e outra para quatro vozes mistas e órgão. A sua funcionalidade é total; o texto é o de São Mateus e este é utilizado no Domingo de Ramos do Ano A. São precisos os 3 diáconos para a leitura dos textos e no momento das turbas temos o coro a cantar as suas proclamações e condenações.
A partitura desta pérola da música sacra portuguesa encontra-se publicada no blog O canto na liturgia, ou seja, ao alcance de todos.
De forma sucinta, em 1991 a liturgia da Paixão viu-se novamente enriquecida com uma nova composição para este efeito – o seu autor foi o Pe. Pedro de Miranda. Com os mesmo efeitos litúrgicos, surge em 2007 a Paixão segundo São João do Pe. Ferreira dos Santos e para terminar este ciclo litúrgico eis que em 2008 o Pe. Joaquim dos Santos escreve uma das suas últimas obras – Paixão segundo São João para 3 solistas, coro misto a 3 vozes, violoncelo e órgão.